Depois de 16 anos de carreira na televisão, Giovanna Antonelli, considera a Clarice de Sete Pecados a sua primeira personagem realmente "popular". Isso no sentido de estar mais próxima da realidade das telespectadoras que acompanham o desenrolar da história de Clarice e Dante, de Reynaldo Gianecchini, seu marido na trama de Walcyr Carrasco. Por isso mesmo, Giovanna precisou observar com mais cuidado o dia-a-dia de algumas donas-de-casa e boas cozinheiras, características principais da mocinha das 19h da Globo. Principalmente porque, quando o assunto é tarefas domésticas, Giovanna não está nem um pouco por dentro.
"Costumo brincar e dizer que a minha parte é animar e decorar ambientes. De resto, sou uma excelente administradora do lar", brinca. Mãe de Pietro, 2 anos, fruto de seu casamento com o também ator Murilo Benício, Giovanna agora só pensa em conciliar a profissão com a criação do filho, que virou sua grande prioridade desde o nascimento. "A maternidade mudou minha forma de enxergar o mundo. Se não dá para estar perto do meu filho, não aceito trabalhar", diz, taxativa, afirmando que só grava a novela de segunda a quinta-feira, para ter mais tempo livre.
Você fez, em 1996, a novela Xica da Silva, também escrita pelo Walcyr Carrasco. Como foi esse reencontro em Sete Pecados?
Sim, aquela foi a primeira vez em que trabalhamos juntos, mas foi completamente diferente. Ele usava um codinome, só no final todo mundo se conheceu e foi muito breve. Sete Pecados é a primeira novela contemporânea do Walcyr. Acredito muito no talento dele, até porque todas as suas obras fizeram sucesso. E acho que estamos no mesmo caminho. Quando recebi o convite estava finalizando a minissérie Amazônia, De Galvez a Chico Mendes e decidi emendar com essa novela porque sentia isso. Sinto até hoje. Para uma mulher com um filho pequeno, como eu, não é uma decisão fácil. Mas fiz a escolha certa. Estava exausta, gravando no Acre e em Manaus. Era tudo intenso, distante. E aí veio esse convite. Eu e o Walcyr não tínhamos nos encontrado depois. E o Jorge Fernando foi outro fator positivo. A gente já tentou fazer cinema junto mas não rolou. A novela acabou sendo uma oportunidade tentadora.
Foi difícil compor uma esposa e mãe que faz doces para fora e é completamente diferente de você ou das suas outras personagens?
Ela é diferente de tudo que já fiz sim, mas acho que qualquer mulher poderia ser a Clarice. Minha maior dificuldade foi passar aquela veracidade na hora de fazer os quitutes. Costumo dizer que sou uma ótima animadora de festas, dou o maior apoio. Adoro decorar ambientes, mas minha participação se resume a isso. Administro muito bem a minha casa, me orgulho disso. Mas longe das tarefas domésticas.
Interpretar uma dona-de-casa aplicada e apaixonada, com ar de mocinha, não influenciou na sua decisão?
Uma actriz vai sempre se dividir entre o universo das mocinhas e das vilãs. Seja para uma personagem principal ou coadjuvante, os papéis tendem a se separar por aí: estar do lado do bem ou do mal. Fiz muitas coisas na carreira. Fiquei feliz por fazer a Bárbara de Da Cor do Pecado, que era uma louca. Depois tive meu filho, fiz Amazônia - De Galvez a Chico Mendes, enfim, acho que uma mocinha agora caiu muito bem. E ela começou ingênua, mas já está mudando a personalidade. Sempre consegui fazer coisas diferentes, sofrer mudanças às vezes radicais na minha carreira. Eu adoro isso.
Que tipo de mudanças?
Cada personagem faz o actor se recriar. Sempre fui muito responsável, do tipo que estuda horas em casa e chega no estúdio com tudo na ponta da língua. Mas, quando você faz isso, acaba predefinindo um estilo de interpretação que fica impresso em você. Em Da Cor do Pecado, tive uma sacada que mudou meu jeito de agir na carreira. Resolvi deixar as emoções fluírem. Quis dar um ar de maluca para a Bárbara e o João Emanuel Carneiro comprou a idéia. Então passei a decorar meus textos quase na hora de gravar. Se eu ficasse estudando, definiria ainda em casa como seria o jeito dela viver aqueles momentos. E ela era intensa e inusitada, precisava do fator surpresa. Com isso me libertei desse perfeccionismo. Eu chego em casa, leio meus capítulos e decupo minhas cenas. E só. Quando chego aqui eu leio de novo e decoro. Isso me deu uma rapidez enorme. E veio uma espontaneidade e segurança com isso.
Você fala da Bárbara, de Da Cor do Pecado, com um ar de saudade. Ela estaria no topo da lista de personagens favoritas do seu currículo?
Ah, com certeza. Em O Clone, a Jade era mais intensa e tinha aquele universo muçulmano, foi muito bom para meu aprendizado. Mas a Bárbara foi a personagem mais incrível que já tive em qualquer veículo. Como actriz, ela me deu inúmeras possibilidades. Foi um ganho. Senti um pouco disso também quando encenei a peça Dois na Gangorra. Foi meu primeiro e único espetáculo profissional. No teatro você tem de levantar a platéia, a resposta é imediata e tudo tem de ser feito em pouquíssimo tempo. Isso dá um dinamismo incrível. A Bárbara foi o meu teatro na tevê, se é que dá para entender. É difícil um papel em novela ter essa resposta como ela teve. As vilãs ganharam um charme, um glamour que prende o público. Os telespectadores sabiam que ela era má, sabiam que ela não prestava, mas adoravam as loucuras dela. Amadureci muito com aquele trabalho. Não tenho preferência por vilãs ou mocinhas, mas a Bárbara marca uma fase única na minha carreira e na minha vida.
Isso dificultou seu trabalho de composição na época?
Não vou dizer que foi fácil, mas me deu mais vontade de fazer. Todas as minhas personagens tiveram seu grau de dificuldade. Você tem de entrar no trabalho por inteira ou então dá zebra. Preciso disso. A Jade me deu muito trabalho e abordou um universo incrível e novo para todos nós. Fiquei três meses em aulas de dança do ventre, eram oito horas por dia de exercícios. Eu queria ser perfeita, me cobro muito. E foi a protagonista da minha carreira. Acho que eu também levo muito a sério qualquer personagem porque sei que uma leva à outra. Fiz a Bárbara por que me saí bem em O Clone. E fui escolhida para interpretar a Jade porque consegui me destacar em Laços de Família. Encaro meus papéis como uma plantação, preciso regar para colher. Percebi isso depois da Capitu.
A Capitu, de Laços de Família, foi uma personagem que começou pequena e ganhou mais destaque ao longo da trama. Você esperava aquele sucesso?
Ninguém esperava, mas eu torcia. Meu trabalho em Laços de Família foi o verdadeiro divisor de águas na minha carreira. A partir dali várias pessoas passaram a me enxergar com outros olhos. E o mais engraçado é que o papel foi recusadíssimo por outras actrizes. Na verdade, eu faria uma outra personagem, a Simone, que era amiga da Capitu. Mas a emissora não conseguia escalar ninguém e decidiu lançar uma nova actriz. Ligava, pedia para fazer o teste, mas me diziam que precisavam lançar alguém que fosse exuberante...
Como você se sentiu com essa justificativa?
Sinceramente, não pensava no que me diziam. Só tentava dar um jeito de conseguir fazer o teste. Estava com tanta vontade de pegar aquele papel que sabia que se me chamassem para um teste, eu passaria. Gosto de estar exuberante nas minhas personagens, mas não faço questão de ser exuberante como mulher. Um dia me chamaram, fiz o teste e acabou acontecendo. E poderia ter dado errado. Pessoas recusaram com medo de rejeição, mas o que eu queria mesmo era arriscar. E consegui.
Como você avalia a sua carreira hoje em dia?
Comecei cedo, trabalhando com crianças, aos 15 anos, no Clube da Criança, da Manchete. A Angélica apresentava. Hoje tenho 31, daqui a pouco estou com duas décadas de profissão. A cada ano que passa a gente amadurece mais e adquire outras oportunidades para mostrar versatilidade. Tento fazer isso na tevê, no cinema e, agora, no teatro. Sou muito crítica e brigo muito pelas coisas nas quais eu acredito. Cada vez eu quero melhorar, fazer diferente, e acho que até agora essa postura vem funcionando. Adoro trabalhar, não consigo imaginar o que eu seria se não fosse actriz. Tirando a época em que tive meu filho, estive sempre trabalhando ou em busca de bons papéis. Acho que tive um pouco de tudo. Empenho, sorte, dedicação... Tive bons personagens e isso contou muito. Se eu for fazer uma retrospectiva, dei muita sorte. Mas ela não serviria de nada se eu não tivesse muito respeito pela profissão e não me entregasse a ela.